CONSIDERAÇÕES SOBRE A CONTRACEPÇÃO MASCULINA

A importância do planejamento familiar pode ser ilustrada pela estatística estadunidense de gravidezes indesejadas, que chegam até a 50% dos casos. Ademais, uma mulher passa em média cinco anos da sua vida estando grávida, no período pós-parto ou buscando engravidar, e mais de 30 anos tentando evitar a gravidez. Do ponto de vista econômico, um crescente número de estudos mostra que o investimento em processos de programação do número de filhos tem uma ótima relação custo-benefício, tanto para as famílias, quanto para os planos de saúde.


Uma crítica recorrente aos programas de planejamento familiar é que o foco de atenção aponta predominantemente para a mulher e o homem acaba ocupando um papel secundário no processo de decisão sobre o método a ser escolhido. Uma visão mais abrangente do tema requer que ambos tenham participação ativa nesse processo. As necessidades masculinas também deveriam ser consideradas, ao mesmo tempo em que a autonomia das mulheres deve ser respeitada.


Enquanto as mulheres dispõem de 11 formas de contracepção, os homens precisam escolher entre duas: preservativos e vasectomia. Os primeiros, embora protejam também contra as doenças sexualmente transmissíveis, apresentam elevado índice de falha (aproximadamente 19%). Já a vasectomia, embora altamente eficiente (mais de 99% de sucesso), tem poucas chances de reversão (50%). Os métodos contraceptivos masculinos são utilizados por 14% dos casais globalmente, sendo que nos países desenvolvidos esse índice sobe para 30%.


Idealmente, o processo de escolha das formas de contracepção deveria ter início já para o público adolescente, ao serem introduzidas as bases de educação sexual para ambos os sexos. Pesquisas mostram que onde a política de igualdade entre os sexos não é aplicada, há menor índice de utilização de preservativos e menor noção de respeito e proteção das parceiras. Além disso, nos países onde há maior igualdade entre os gêneros, há também maior aceitação da vasectomia.


Desde a descrição inicial da vasectomia para esterilização de cães em 1827, o procedimento já passou por diversas fases até ser uma prática comum e bem aceita como acontece nos dias atuais. No início do século 19, acreditava-se que a vasectomia aliviava a dificuldade de urinar causada pelo crescimento prostático, fato que foi refutado na primeira metade do século 20, quando também muitos promoviam a esterilização cirúrgica involuntária para criminosos, pervertidos e até mesmo para pessoas muito pobres ou bêbados habituais. A esterilização compulsória com a finalidade de eugenia passou a não ser mais aceita apenas a partir da década de 1960. A popularidade da vasectomia cresceu bastante desde então, mas ainda permanece subutilizada. A laqueadura tubária é realizada três vezes mais frequentemente do que a vasectomia, apesar de ser uma operação com maiores custos e riscos.


A vasectomia é o método mais seguro de contracepção e o único definitivo, com índices de falha inferiores a 1%. A lei brasileira exige um período mínimo de dois meses entre a consulta médica para receber informações sobre o procedimento e a sua realização. Nesse período, o casal deve refletir sobre sua decisão, tendo tempo hábil para se informar melhor e até mesmo mudar de ideia.


A lei também estipula os critérios de ter no mínimo dois filhos ou 25 anos de idade para ser submetido à esterilização cirúrgica. Homens casados devem ter o consentimento da esposa. Os pacientes com idade superior a 30 anos e que estão em um relacionamento estável parecem ser os melhores candidatos para a operação. De acordo com os resultados de um estudo a esse respeito, aqueles que realizam a operação com idade entre 20 e 30 anos solicitaram a reversão 12 vezes mais frequentemente do que os maiores de 30 anos. Curiosamente, os pacientes que já tinham filhos se arrependeram da vasectomia mais comumemente do que aqueles sem filhos. Não foi encontrada correlação com número de filhos, profissão ou número de casamentos. Como esperado, o início de um novo relacionamento é um fator altamente associado ao desejo de realizar a reversão da vasectomia.


Alguns pacientes ficam em dúvida quanto à realização da esterilização cirúrgica quando a esposa está próxima ao extremo da vida reprodutiva, ou seja, no climatério. É importante destacar que essa fase pode se estender desde os 40 anos de idade até os 55 anos, aproximadamente, quando ocorre a menopausa. Embora o número de anos a serem aproveitados após a vasectomia possa ser menor se comparado à cirurgia feita em idade mais precoce, essa é uma fase da vida da mulher na qual a contracepção é especialmente importante. Os riscos para a gestante e para o concepto são maiores, incluindo anomalias genéticas como a síndrome de Down. Nessa fase, os métodos definitivos de contracepção, a laqueadura tubária e a vasectomia são opções interessantes para muitos casais.


A Casu conta com uma equipe de planejamento familiar que inclui profissionais da Psicologia, o que aumenta bastante a chance de uma decisão bem ponderada. Todos os pacientes que irão ser operados passam por essa avaliação psicológica. A cirurgia deve ser feita em ambiente de bloco cirúrgico, podendo ser utilizada a anestesia local apenas, ou a associação com a sedação, o que aumenta o conforto do paciente. É importante que se faça uma avaliação clínica cuidadosa para que a operação ocorra em condições ideais, com o menor risco possível.


Tecnicamente falando, a vasectomia consiste na ligadura dos ductos deferentes, que transportam os espermatozoides dos testículos até as vesículas seminais. Como o volume do líquido testicular é pequeno, não ocorre redução do volume do ejaculado, pois as vesículas seminais fornecem a maior parte desse volume.


São feitas duas pequenas incisões na base do escroto para serem acessados os ductos. As possíveis complicações de curto prazo são sangramento e infecção (ocorrem em menos de 5% dos casos) e a de longo prazo é a formação de granuloma. Os granulomas são pequenos nódulos que se formam na extremidade do ducto deferente no período pós-operatório e que tendem a desaparecer com o passar do tempo. Ocorrem em cerca de 6% dos casos, sendo pouco sintomáticos na maioria das vezes.


Recomenda-se que o paciente evite esforços físicos intensos na primeira semana para reduzir o risco de formação de hematomas. O uso de suspensório escrotal também pode trazer conforto, por manter os testículos mais protegidos junto ao corpo. Orienta-se que o método contraceptivo previamente utilizado seja mantido até a confirmação do sucesso da operação, no mínimo dois meses depois. Essa confirmação é dada pelo exame de espermograma, que deve então mostrar a ausência de espermatozoides.


Finalmente, para o paciente que deseja maiores informações sobre a operação ou mesmo quando já está decidido pela vasectomia, o ideal é que ele agende uma consulta com um urologista para dar início ao processo, que já está devidamente estabelecido na rede Casu.

 

Referências bibliográficas:

1) Sandlow JI, Johnson D. Vasectomy: tips and tricks. Trans Androl Urol 2017;6(4):704-9.
2) Di Bella ZIKJ, Bianchi AMHM, Araújo FF, Sartori MGF, Girão MJBC. Contraception and family planning at the extreme of reproductive life - climateric. Rev Assoc Med Bras 2016;62(5):454-7.
3) Cleland K, Peipert JF, Westhoff C, Spear S, Trussel J. Family planning as a cost-saving preventive health service. N Engl J Med 2011; 364:e37.
4) Rayala BZ, Viera AJ. Common questions about vasectomy. Am Fam Physician 2013;88(11):757-61.

Dr. Daniel Xavier Lima
Médico Urologista
RIS - Rede de Interação em Saúde

 

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